Art.
Foi na gibiteca da 508 sul que muitos do meus amigos e colegas tiveram os primeiros contatos com a arte dos quadrinhos, charges e cartuns, e essas foram uma das muitas possibilidades dadas pelo convívio no que hoje é o Espaço Cultural Renato Russo, e funcionava como hoje, era um ponto de encontro para todos os estudantes das escolas das redondezas, repletos de alunos curiosos e sedentos por fazer cultura. Foi nesse espaço que nasceu a Gibiteca.
Originaria de uma grande doação do poeta T.T Catalão no tempo que foi diretor do centro cultural na W3 sul. Durante anos a Gibiteca T.T Catalão, foi um ponto de encontro de artistas como eu, todos ilustradores em busca de um propósito que pudesse significar muitas de suas criações, e foi no laboratório da gibiteca onde as melhores ideias foram postas em prática e grande parte do que era desenhado foi também publicado durante os anos 1990, e tinha um ponto de origem nesse espaço de gibis e artes. Fazendo valer a máxima de que os grandes artistas visuais do século XX e XXI tem nos quadrinhos as suas formas de interpretar o mundo através das suas cargas de cultura visual.
O Cartunista Ziraldo comentava sempre que se tornou artista pelo contato com os quadrinhos de J. Carlos, Agostini, Péricles e outros, e creio que todos os jovens artistas que se propõe a ser um narrador artista, tem nas páginas dos quadrinhos um ponto de fusão interpretativo. Nesse espaço as nossas referencias não eram somente nacionais, mas também tínhamos contato com o melhor dos quadrinhos, verdadeiros autores de clássicos como Will Eisner, Frank Miller, Millo Manara, Stan Lee, Moebius, Norman Rockwell e outros grandes ilustradores de editoriais diversos, mas também os autores nacionais e locais que deu um norte para muito dos garotos que sonhavam com a profissão.
O caminho da arte editorial no DF começou nas páginas do Pasquim em 1970, com o artigo com ar de poema ilustrado MANIFESTO HIPPIE intitulado ‘Você está na sua?’ do jornalista e ativista da contracultura Luiz Carlos Marciel, que profetizava:
“Seguinte: O futuro já começou.
Não se pode julgá-lo com as leis do passado. A nova cultura é o começo da nova civilização. E a nova sensibilidade é o começo da nova cultura. Sua continuação é a nova lógica, Não: as leis do passado não servem.”
(PASQUIM 1970, edição 29, p 12)
Esse é o modus operandi que motiva muitos artistas que buscam em suas vizinhanças o motivo para se fazer quadrinhos com crítica, assim, tínhamos na gibiteca fortes referencias das artes visuais local, Jô oliveira, Duarte, Lopes, Cícero e Gou Gon, que tinham suas publicações disponíveis, e isso mostrava aos jovens que era possível criar um bom editorial ilustrado no DF. A pioneira foi a revista ‘Risco’ de 1974 que somente com três edições inaugurou as edições de humor na capital e a forma de se desenhar a política, como o nome da revista sugere, não era um bom momento histórico para que alguns artistas expressassem suas opiniões, mesmo que maneira distinta e até modesta.
Nos anos de 1980 o cartunista e jornalista Henrique Gou-Gon, lançou o seu livro ‘Fogo Cerrado’ com uma grande produção de artigos e desenhos publicados nos jornais de Brasília daquele ano, sua maioria sobre o embate dos metalúrgicos contra o governo militar, e esse material estava sempre disponível para todos poderem consultar, e principalmente se inspirar com a arte do humor que nascia em meio a ditadura. Acredito que esse foi um fator importante para formação do sujeito artista na capital, a ditadura fazia um papel de antagonista para as aspirações de todos os jovens artistas, e de alguma forma carregamos isso nos livros que lemos e na forma de informação que recebíamos. Era um espaço que poderia se praticar o pensamento crítico.
As pessoas que frequentavam a gibiteca eram em sua maioria jovens, buscando no espaço cultural essa diretriz educadora atrelada ao modo em que os eram apresentados, neste espaço a interdisciplinaridade era intrínseco aos modelos formativos, aprendíamos redação em narrativas visuais, e outras formas de informar foram sendo postas em prática. Não há toa, a maioria dos professores artistas visuais hoje tem um contato íntimo com a Gibiteca, que posteriormente foi anexada à biblioteca de arte na 508 sul, nos mostrando a potência deste espaço de arte e leitura na formação além do espectro da arte.
Amo o seu trabalho. Viva a gibiteca!